Dr. Dirceu Rodrigues Alves
Na lei dos caminhoneiros, sancionada recentemente, encontramos
coisas incompatíveis com o bom senso. Jornadas de trabalho desajustadas com outras
categorias, desobediência à consolidação das leis trabalhistas, com a qualidade
de vida do trabalhador, com os riscos a que é submetido e com a discriminação.
Para caracterizarmos isso, vamos avaliar o tempo de trabalho permitido bem como
a obrigatoriedade do exame toxicológico.
Estamos longe de encontrarmos
soluções para redução dos nossos acidentes, de mortes, sequelas, perdas
patrimoniais, famílias que ficam no desalento, desprotegidas e que certamente
produzem grande prejuízo social.
Não podemos pensam que o
motorista ao sentar-se na direção veicular sai a passeio. Que sentado, vendo
paisagens diferentes está fazendo uma higiene mental e com isso pode tolerar 12 a 13 h de jornada de
trabalho. Também não podemos ignorar que a cada 4 h na direção veicular o homem
tem lapsos de atenção, que com 8 h tem déficit de atenção e que acima disso o
risco de acidente aumenta em duas vezes.
Ignora-se ainda que a vibração
de corpo inteiro, o ruído uniforme e contínuo, o movimento pendular do tronco e
da cabeça, as imagens que passam no seu campo visual durante toda a jornada são
fatores indutores da fadiga e do sono. Fora isso, se incorpora os distúrbios do
sono, principalmente da privação do sono, coisa comum entre os caminhoneiros
decorrentes de um repouso em local inadequado, dentro da boleia, na rede
pendurada, contrariando o que é recomendado pela higiene do sono. A vibração de
corpo inteiro capaz de levá-lo ao final da jornada à exaustão física. A
alimentação de rua, o estresse físico, psicológico, social, o medo de ter um
acidente, de causar dano a terceiros e ao patrimônio, de ser assaltado,
sequestrado e até morto.
Não se pode permitir que um
trabalhador submetido à agressão física, caracterizada pela vibração e o ruído
já citados, a variações térmicas e climáticas, a risco químico em decorrência
de exposição a gases, vapores, poeiras, fuligem além dos produtos químicos que
possa estar transportando, não tenha limite restrito a tal exposição. Ainda o
risco biológico pelo fato de estar submetido a doenças endêmicas, infecto
contagiosas, doenças tropicais, nas diversas regiões por onde transita, além
das condições de higiene precária na boleia e do próprio corpo e também quando
transporta cargas orgânicas. O risco ergonômico pelo trabalho repetitivo que
executa e dependendo das condições de manutenção do veículo submetendo-o a
maior esforço. Ainda o risco de
acidentes, de problemas com cargas perigosas, com o isolamento da família e da
sociedade, desenvolvendo trabalho em situação de isolamento.
Não se pode entender que
submetido a tantos agentes agressivos e nocivos possa ser visto como um
trabalhador comum. Não o é.
O Departamento de Medicina de
Tráfego Ocupacional da Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (ABRAMET)
não pode estar ausente e tão pouco furtar-se a criticar a lei ora sancionada
por ser uma lei avessa às necessidades da sofrida classe trabalhadora que é uma
das responsáveis pelo progresso desse país.
Este trabalho é para todos nós,
que estudamos, pesquisamos e temos nossa atenção voltada para a máquina, o
homem e o meio, é de extrema penosidade e acreditamos que haverá uma revisão
dessa matéria com objetivo maior de redução de custos para o país, redução dos
óbitos que todo dia estão em nossas manchetes e que é o principal fator da
nossa luta pela vida.
As causas primordiais de
acidentes em nossas rodovias são fadiga 18% e sono 42% perfazendo uma
estatística alarmante de 60% de todos os nossos acidentes. Vale a pena lembrar
que 93% dos acidentes acontecem por falha humana. Costumamos dizer que hoje, em
todo acidente rodoviário tem um motorista profissional envolvido e que o motivo
principal é o excesso de jornada de trabalho.
Defender essa classe
trabalhadora das agressões do trabalho e das jornadas longas não pode ser diferente do médico e da enfermeira que têm
uma jornada de 6hs e o risco é a insalubridade, do funcionário do banco com
risco ergonômico e do telemarketing que trabalha apenas 6 h, e o risco físico caracterizado
pelo ruído sendo responsável por essa jornada reduzida.
Motoristas usam drogas porque são explorados, escravizados
numa atividade de alto risco para si e para terceiros. Salários e fretes
insuficientes diante de combustíveis, pedágios, manutenção caros.
Leigos, em nossas câmaras legislativas, aprovam leis sem uma
consultoria especializada. Melhor remuneração seria o suficiente para redução
da jornada de trabalho, redução das mortes e sequelados oriundos das estradas e
permitindo uma melhor qualidade de vida. O uso de drogas pelos caminhoneiros é
pela sobrevivência já que não conseguem remuneração adequada ao sacrifício que
são submetidos. O governo, empresário, o embarcador, os levam a trabalho
extremamente sofrido.
O exame toxicológico é uma afronta ao trabalhador, é achincalho
discriminatório, humilhante já que jamais poderá ser correlacionado a possível
acidente. Lembro que o exame é de larga janela, janela essa que tem noventa
dias.
O que é o exame:
Material
a ser coletado:
Tufo de
cabelos ou raspado de unhas.
Objetivo
a detectar:
Drogas: Maconha, cocaína e derivados,
anfetaminas, metanfetaminas,
ecstasy, opiáceos e codeína.
Quem faz
a coleta do material:
Profissional da área de saúde com treinamento
especializado.
Custo: Coleta do material R$
40,00
Exame toxológico R$ 320,00
Total:
R$ 360,00
Surgem as perguntas:
Determina o dia e a hora que a droga foi usada? Não
Pode o motorista usar a droga fora do seu horário de trabalho? Sim
Nesse caso ocorre punição? Não
O usuário para a lei brasileira é
um criminoso? Não.
Caso positivo o resultado, poderá
ser pedido contra prova? Sim.
Quanto tempo se levará com o
trabalhador afastado do trabalho, caso positivo?
Tempo indeterminado.
Compromete a perícia médica do INSS?
Sim
A fraude é possível? Sim, o
usuário poderá manter o uso da droga para manter-se
recebendo
auxílio doença.
O álcool pode ser usado
no período de lazer. E a droga?
O exame deu positivo, o empresário pode mandar embora?
Não, ele é um dependente químico. Deve tratá-lo.
Ora, porque se faz uso do bafômetro nas blitz?
Para se constatar a presença de álcool na direção veicular.
Porque as outras drogas não são assim?
Interessa a alguém se o sujeito passa o domingo bebendo ou
usando droga fora de sua jornada de trabalho?
As drogas na direção veicular precisam ser combatidas diariamente.
É necessário entendimento, compreensão de todos, para não gerarmos o sacrifício
financeiro de “novo pedágio”, vamos chamar assim, além da crucificação do nosso
caminhoneiro.
O país que está à beira da legalização da droga, comprova a
agressão que está sendo feita.
Dr. Dirceu Rodrigues Alves Júnior
Diretor de
Comunicação e do Departamento de Medicina de Tráfego Ocupacional da
ABRAMET
Associação
Brasileira de Medicina de Tráfego